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sexta-feira, 30 de maio de 2014

“IMPUNIDADE PARLAMENTAR”. Opinião, por Ronie de Oliveira Coimbra*




 O Leitor pode estar se perguntado se não errei o título, quando o correto seria imunidade parlamentar ou foro privilegiado. O fiz propositalmente, pois em dias atuais, a meu juízo, se tornaram sinônimos.
Entendo que realidades como a do Brasil e dos Estados Unidos não podem ser, superficialmente ou com poucos critérios, comparadas, mas admiro muito, quando assisto as séries policiais televisivas americanas, a exemplo de CSI, Criminal Minds, dentre outras, quando, em muitas situações, os políticos daquele País são presos pela polícia, e julgados pela mesma Justiça que julga os demais cidadãos, sem, o que chamamos por aqui, “foro privilegiado”.
Existem exemplos recentes de escândalos de corrupção, inclusive no Estado do RS, em que as pessoas que não tem o foro privilegiado foram condenadas – e ressalto que se mereceram não há o que reparar ou lamentar – baseado em provas consistentes, como escutas telefônicas e documentos, probatórias da autoria e materialidade do crime. Entretanto, pessoas detentoras de cargos políticos ou públicos, e abrigadas pelo manto da proteção do foro privilegiado,  tiveram contra si as mesmas provas, porém, para que elas fossem validas, deveriam ter a produção autorizada pelo Tribunal competente para investigá-las.
Estes Tribunais, eu vi muitas vezes, em muitos casos sequer analisaram o mérito, ou seja, se existia culpa ou responsabilidade do agente detentor de cargo político ou público, mas sim analisaram tecnicamente, invalidando qualquer prova cuja produção não tivesse autorização do Tribunal competente para determinada autoridade, mesmo que a autorização fosse chancelada por um Magistrado de Tribunais de Instância inicial.
Mas antes de prosseguir vejamos o modelo de foro privilegiado brasileiro: Ao STF cabe julgar o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República nos crimes comuns e, nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado, os membros dos Tribunais Superiores (STJ, TST, TSE e STM), do Tribunal de Contas da União e chefes de missão diplomática de caráter permanente (art. 102, I, “b” e “c”). Ao Superior Tribunal de Justiça cabe julgar, nos crimes comuns, os Governadores de Estados e do Distrito Federal e, nestes e nos de responsabilidade, os Desembargadores dos Tribunais de Justiça, os membros de Tribunais de Contas dos Estados, TRFs, TRTs, TREs, Conselhos e Tribunais de Contas dos Municípios e agentes do Ministério Público que atuem nos Tribunais (art. 105, I, “a”). Aos Tribunais Regionais Federais atribui-se o julgamento, nos crimes comuns e de responsabilidade, dos Juízes Federais, Juízes do Trabalho, Juízes Militares e Procuradores da República, da área de sua jurisdição (art. 108, I, “a”). Ao Tribunal Superior Eleitoral cabe julgar os Juízes dos Tribunais Regionais Eleitorais e, a estes, julgar os Juízes Eleitorais, nos crimes de responsabilidade. Finalmente, aos Tribunais de Justiça cabe o julgamento dos Prefeitos (CF, art. 29, VIII) dos Juízes de Direito e Promotores de Justiça, Secretários de Estado e outras autoridades conforme previsão nas Constituições Estaduais.
Necessário, ainda, explicar que crimes comuns são os previstos no Código Penal e leis extravagantes, e crimes de responsabilidade são aqueles praticados por funcionários públicos e agentes políticos (p. ex., Prefeitos e Juízes) em razão de suas funções. De resto, cumpre registrar que os Deputados Federais e Senadores, uma vez recebida pelo STF a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal, poderão ter a ação penal sustada, se assim decidir a Casa a que pertençam. (CF, art 53, § 3º).
A conclusão que aflora de minhas reflexões é de que o modelo brasileiro, como está posto, produz sim impunidade. O modelo forja iniqüidades incompreensíveis, a exemplo de duas pessoas que foram pegas em uma escuta telefônica, autorizada por um Magistrado de Tribunal de Primeira Instância, cometendo crime de corrupção. Uma delas não tem foro privilegiado, portanto a prova será valida no processo, a outra, em razão de determinado cargo político ou público, terá foro privilegiado, portanto a prova não será válida, e terá que ser novamente produzida, desde que autorizada pela Corte competente. Caso não se produza prova novamente, está materializada a impunidade e a iniqüidade, pois certamente, pela prova produzida, temos dois criminosos: Um será, com certeza, processado e condenado, eis que é um “cidadão comum”; o outro, por ter foro privilegiado, neste caso, sequer será processado, e, se tratando de Brasil, mesmo que a imprensa torne público o caso, dificilmente perderá o cargo.
A quem interessa esta disparidade, este privilégio? A essência do que chamamos de Justiça eu creio que não, eis que a sua imagem, com uma balança em equilíbrio, vendas nos olhos e a espada pronta a restaurar a justiça, não se aplica a este modelo, cuja balança pende para o detentor do foro privilegiado; e cuja venda permite, ao menos em um dos olhos, enxergar com menos severidade os privilegiados; e a espada é implacável com os sem privilégios, porém mais contida com os privilegiados. Seria em nome da autonomia que Tribunais Superiores teriam para julgar autoridades? O preço da autonomia, penso, é muito alto, pois se cria castas de criminosos: Os que não tem foro privilegiado, e muito provavelmente serão condenados; e os que tem foro privilegiado, estes muito provavelmente escaparão da condenação, se processados forem.
Hoje em dia muito se fala em igualdade, de norte a sul, de leste a oeste deste Brasil, portanto, já passou muito da hora da Justiça ser distribuída equanimente, sem privilégio para este ou aquele, e, por conseguinte, a balança seja equilibrada para todos; a venda de seus olhos não permita que se enxergue para quem a justiça será distribuída; e que a espada desça, fulminante, a cortar a cabeça dos que mereceram, e que as pessoas sejam julgadas por seus atos, não interessando sua posição social ou cargo que detenha.

Major da Brigada Militar do RS


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