segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012
E a cara do corruptor, por Moisés Mendes
Zero Hora - 05 de fevereiro de 2012
ARTIGOS
E a cara do corruptor?, por Moisés Mendes*
O jornalista Caco Barcellos tem um projeto de difícil execução. Caco já fez tudo que um jornalista pode fazer, mas nunca conseguiu entrevistar um bacana que consome drogas. Um executivo, um empresário, um publicitário, um bancário ou banqueiro, um artista, um jornalista, um engenheiro que cheire cocaína. Não se encontra. Chega-se com facilidade ao traficante e ao consumidor de drogas baratas nas ruas, mas ao bacana não há como.
O consumidor classe média ou ricaço, que corrompe o favelado para que ele lhe garanta o vício, é um cínico tímido. Não há consumidores disponíveis para revelações. Você sabe de celebridades que confessam abortos, que contam intimidades, que falam de mazelas familiares, mas não encontra quem seja capaz de dizer: eu sustento o tráfico para me manter antenado e competitivo.
São faces que o Brasil guarda nas sombras, assim como os corruptores. Você vê o cara com dinheiro na cueca, o vereador que pega diárias para fazer turismo, o assessor que abre as portas do ministério para falcatruas e fica com uns mirréis. Mas o corruptor, o graúdo, não aparece. Há tempos estamos entretidos com os flagrantes de chinelões que batem carteira ou fazem a intermediação de propinas. Acredite: esses ficam com as moedas, são os flanelinhas dos governos, guardam vagas por quase nada, aceitam sobras, alguns são flagrados e somem, ou morrem ou se matam.
Mas onde se esconde o corruptor privado, o que superfatura, que pega aditivos, que convence governos a pagar por obras precárias? Que cara tem essa figura peluda que arquiteta e atualiza a tecnologia da falcatrua em Brasília e nos governos estaduais, fica com a parte do leão, nunca se mostra e nunca devolve o que embolsou? O senador Pedro Simon tentou ver esses bichos pela frente na CPI das Empreiteiras. Insistiu, desde 1993, nunca conseguiu apoio, e a CPI não saiu, porque a face protegida dos corruptores também faz parte de um dos vergonhosos pactos de silêncio em vigor no Brasil.
Você sabe que Luiz Felipe Denucci Martins, ex-presidente da Casa da Moeda, estaria sendo corrompido por duas empresas que lhe pagavam propina. Sabe até os nomes das empresas que ele abriu em paraísos fiscais e o nome da filha sócia de Martins. Mas ainda não sabe quais são as empresas corruptoras e dificilmente saberá quem pagava o homem que fabricava nosso dinheiro.
No filme Homens de Bem, de Jorge Furtado, que a Globo exibiu há pouco, Rodrigo Santoro é Ciba, um araponga a serviço da Polícia Federal. Ciba segue políticos que podem ser corruptos. Vemos as caras dos políticos, mas ficamos diante de um, apenas um mandalete de corruptor. Nem o cinema consegue mostrar a cara do chefe, de quem exerce o poder de corromper, porque o chefão é cuidadoso.
O resumo previsível de tudo isso é: o consumidor de rua, de maconha ou crack, é a parte mais frágil e visível do ramo pobre de um grande negócio, em que o grande cheirador que corrompe nunca aparece nem mesmo para Caco Barcellos.
É assim também com o chinelão que enfia dinheiro nos bolsos, em flagrantes que se repetem no YouTube. Ele é apenas a caricatura, a figura simplória que nos diverte e nos confunde, porque o grande corruptor não tem rosto. E daí? E daí que eu quis apenas estragar seu fim de semana, porque nada vai mudar. Os pactos de silêncio estão aí para serem respeitados.
*JORNALISTA
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Pessoal desinformado esse... recentemente Rita Lee, no show de despedida dos palcos, expressou sua opinião sobre a questão das drogas. Marcelo D2 nunca escondeu suas preferências, desde o "Planet Hemp". Tim Maia, Benjor, Moraes Moreira... perde-se a conta de quantos artistas já se manifestaram contra a proibição moralista e despropositada que vivemos. Isso sem citar publicitários, cineastas e até políticos. A melhor coisa para aperfeiçoar os serviços de polícia seria deixar pra trás este moralismo babaca e esta hipocrisia, e admitir que nunca se poderá legislar sobre as liberdades individuais - pois afinal elas são liberdades, e não carecem da regulação do estado.
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