Um arsenal fora de controle
Um relatório entregue à Chefia da Polícia Civil, ao qual ZH teve acesso com exclusividade, revela falta de controle sobre as armas apreendidas com criminosos e mantidas em delegacias de Porto Alegre. O documento, que se refere a 2010, identificou:
106 armas sem registro quanto ao destino.
Em português claro: é possível que tenham desaparecido em vez de tomar o rumo que deveriam.
102 pistolas, revólveres e espingardas desvinculadas de ocorrências ou inquéritos policiais.
Traduzindo: não se sabe como chegaram às DPs e por que são mantidas lá.
Na melhor das hipóteses, ocorreram erros administrativos, como preenchimento equivocado de livros, dados insuficientes em registro de ocorrências ou falhas no envio para perícia. No pior dos cenários, sinalizam a possibilidade de desvio do armamento, como flagrado há duas semanas na Região Metropolitana.
Em 2010, quando promotores do Controle Externo da Atividade Policial realizaram a inspeção, encontraram 870 armas – muitas “acondicionadas em lugares de pouca segurança, como armários de madeira”.
Elas deveriam permanecer nas repartições tempo suficiente para a conclusão dos inquéritos, conforme prevê o artigo 11 do Código de Processo Penal. Não foi o que aconteceu, basicamente, por dois motivos: porque milhares de inquéritos deixam de ser instaurados, como se verá mais adiante, ou porque, mesmo quando abertos, carecem de investigação para que sejam concluídos.
Para o armamento sem vínculo a procedimentos policiais, a orientação da Chefia de Polícia é enviá-lo, num prazo de 48 horas, ao Comando do Exército, o que também não ocorre.
Um dos exemplos é a 15ª DP, que abrange áreas conflagradas como o Campo da Tuca. Foram localizadas 243 armas “no interior de um baú de madeira que, embora seja trancado com um cadeado, resta evidente a fragilidade do acondicionamento e facilidade de violação”.
Caminho para a corrupção
Outra situação curiosa foi identificada na 8ª DP, em Petrópolis. Das 56 armas apreendidas, três revólveres sumiram: um Rossi AA 047723, calibre 38, três polegadas, um calibre 32 e um Rossi, calibre 22, número de série 90981. Consultado sobre o sumiço, o delegado (cujo nome não consta no relatório) respondeu:
“...devido ao largo lapso de tempo percorrido, seria necessário e imprescindível que fossem verificadas as cópias dos procedimentos policiais elaborados, os quais se encontravam, presumivelmente, no local denominado porão, área de difícil acesso pela notória insalubridade e demais riscos à saúde”.
A situação já foi bem pior. Três anos atrás, havia cerca de 3 mil armas guardadas nas DPs da Capital.
Um risco de mantê-las em delegacias é torná-las alvo de bandidos. O alerta é feito pelo MP, conforme consta no documento obtido por ZH:
“De há muito, vinha-se observando a grande quantidade de armas apreendidas em comunicações de ocorrência policial e que, por longo tempo, ficavam nas dependências do órgão policial civil... A questão é que nem todas as delegacias estão preparadas para armazená-las, pois ainda que muitas possuam cofre, por vezes o espaço se demonstra suficiente, pelo que elas passam a ser acondicionadas em lugares de pouca segurança, como em armários de madeira.”
Diante do quadro perturbador, o delegado Paulo Grillo, um dos corregedores da polícia gaúcha, avisa:
– O descontrole se presta para corrupção e enxertos (colocar revólveres na cena do crime). É um perigo.