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domingo, 26 de julho de 2015

Bangue-bangue Tupiniquim, por Oscar Bessi*

Somos humanos e contraditórios. Nosso corpo sólido é sustentado por líquidos. Nossos amores sucumbem ao ódio. Lembro do dia em que meu inesquecível comandante Cirne pôs a mão em meu ombro e disse, cuidado para não te brutalizar. Eu dedicava meu tempo a enfrentar assaltantes e traficantes ao lado dos meus soldados. Hoje, releio suas palavras a cada hora de engolir meus tarjas pretas. Estive às vésperas da intolerância cega que toda guerra cria na alma. A guerra é bruta, constante e injusta. A literatura me salvou, sempre, com seu poder de humanização. Nem todos têm esta chance.

Não há como ignorar a ferida que dói e muda a vida e o olhar das vítimas dessa violência cotidiana. Os mais espiritualizados sucumbem ao desejo de vingança. É humano. Nada fácil ter seu comércio, sua casa e seu corpo vilipendiados por bandidos sádicos. Porém, a inquietude pode ter outro alvo: o descaso dos poderes públicos. E falo em sentido amplo, não só da valorização das instituições de segurança pública e seus profissionais, mas do cumprimento real das leis e da educação que previne todos os males. Estas áreas, infelizmente, há muito andam em último plano.

Uns congressistas agora se aproveitam da dor popular para novo discurso oportunista e falso: flexibilizar o estatuto do desarmamento. Com o bordão “cidadãos de bem desarmados”, camuflam intenções sem enrubescer. Atendem a interesses de patrocinadores de campanha, como o deputado acusado de homicídios, entre eles o de um cabo da PM (que não era bandido). É o cidadão que deve se defender, no cada um por si, ou o estado que tem o dever de protegê-lo? Não pagamos impostos? Cinquenta mil brasileiros morrem num ano vítimas das armas de fogo. Se flexibilizar o desarmamento, serão duzentos mil. A maioria, jovens. O único problema do estatuto é o de toda lei brasileira: não há o costume de cumpri-las. É com o que os parlamentares têm de se preocupar. Não em liberar o bangue-bangue no território tupiniquim.

Quem andará armado, ao mudar a lei? Cidadãos pacatos? Alguns. Mas também os bêbados do trânsito, que já matam demais com suas loucuras, os drogados, os maridos violentos, os inconsequentes de toda ordem. Qualquer discussão virará duelo. Nossos filhos estarão nas ruas, como alvo. O trabalho policial preventivo ficará ainda mais difícil. Arma defende o “cidadão de bem”? Pesquise: quando não é chamariz para assaltos, o sujeito ao tentar usá-la leva a pior. Raras reações dão certo. Uma infeliz realidade. A bancada da bala quer a guerra, o povo quer paz. Mas eles se aproveitam da dor cidadã para inflar ódios e atender patrocinadores, não para frear essa fábrica de bandidos. Insegurança e medo interessam a muita gente. Que triste.


*Capitão da BM e colunista do Correio do Povo.

 

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