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quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Cara Limpa, por Martha Medeiros


Não sou analista política e não tenho conhecimento para avaliar o que faz com que um candidato se eleja e outro não. São inúmeras as variantes que levam a um determinado resultado, mas uma coisa me chamou a atenção nesse pleito: o discurso ensaiado não comove mais.

É tanta coisa em jogo numa eleição que os políticos se cercam de marqueteiros e assessores a fim de não desperdiçarem nem um segundo do seu tempo. Cada palavra, cada verbo, cada expressão é meticulosamente estudada para provocar tal e tal reação. Dá certo nas propagandas de maionese. Quando o produto é gente, não é bem assim: o eleitor percebe não só a embalagem e o slogan, mas o que fica subentendido.

Coloque uma câmera de TV na frente de qualquer pessoa e diga: está no ar, pode começar a falar. Não é fácil para ninguém. Nem para amadores, nem para profissionais. Porém, tem sido mais danoso justamente para os profissionais, que ao se tornarem figuras públicas assumem uma imagem farsesca e esquecem quem são de verdade. Ficam empertigados e exageram na sisudez. Não se permitem coçar a cabeça, sorrir, brincar. Mantêm o esqueleto rígido e a voz grave para transmitir autoconfiança absoluta. Mas quem é tão autoconfiante assim?

Estamos sedentos de gente espontânea, sincera, natural e falível. Gente que assume ter dúvidas e que se coloca disponível para tentativas reais, não para feitos heroicos. Sartori foi um exemplo. Recebeu mais de 2 milhões de votos e desconfio que metade de seus eleitores nunca tenha ouvido falar dele antes de agosto. Por que angariou tanta simpatia? Porque não agia como um boneco de corda, não tinha o texto decorado na ponta da língua, não se apresentou como super-herói. Extra, extra!

Havia alguém com essas características também na corrida presidencial: Eduardo Jorge, do PV. É claro que é mais fácil ser natural quando a visibilidade é pequena. Não tendo nada a perder, nenhuma declaração é arriscada. Mesmo eu levando essa vantagem dele em consideração, me pareceu outro exemplo de autenticidade.

A empáfia é cafona. Já não há paciência para lideranças empostadas e inacessíveis. Saindo da política para a religião: até os ateus saúdam o papa Francisco, por quê? Ora, porque tem gente ali dentro. Não é uma carcaça blindada circulando pelo mundo. Ele está no meio de nós – mesmo.

Falar com o coração, se abrir, desarmar-se, nada disso garante que a criatura será um bom governante. Naturalidade sem bons projetos, experiência e instrução não serve para nada. Ainda assim, prefiro quem mostra a cara àqueles que usam máscaras. Estou em campanha pela espontaneidade – na política e fora dela. Basta de semideuses de fachada. É hora de voltarmos a ver gente transmitindo alguma emoção.

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